Faça o download do Caderno de Resumos do I Congresso Internacional da Rede Brasil-Ricœur: Identidade e Hermenêutica crítica
Criador de conceitos hoje indispensáveis, tanto no plano filosófico quanto no plano do conhecimento interdisciplinar, Paul Ricœur(1913-2005) tomou para si a tarefa incansável de dialogar com numerosos expoentes de vários campos do saber, com os quais contribuiu significativamente na composição do pano de fundo da produção de pensamento do século XX.
Que Ricœur tenha ao mesmo tempo afirmado sua identidade de homem de esquerda, de cristão, de cidadão ocidental, mas sem se contentar filosoficamente com ela, já é uma ilustração de sua proposta fundamental para a interpretação da existência humana: que ela seja uma hermenêutica crítica.
A expressão, forjada no intuito de arbitrar a controvérsia entre Habermas e Gadamer, embora tenha dado título a um dos subcapítulos do livro Do texto à ação, o famoso “Para uma hermenêutica crítica”, surgiu também no coração de um processo de amadurecimento filosófico fascinante: o de um projeto todo ele norteado pela recusa de produzir uma ontologia direta que se pretenda imune e surda às conquistas incontornáveis da ética e das ciências humanas, às quais, segundo Ricœur, devemos tantos esclarecimentos críticos imprescindíveis acerca do mundo em que vivemos.
Para Ricœur, porém, assim como a vocação da filosofia é decididamente crítica, seu primeiro passo é reconhecer o conflito.
A conflitualidade na busca da verdade do sentido já está no grande livro A simbólica do mal, onde o próprio conflito entre diversos símbolos e mitos do mal torna-se produtivo para o pensamento, dando justamente o que pensar. O conflito das interpretações irá rapidamente se tornar para Ricœur uma matriz produtora de pensamento dialético entre a interpretação redutora do sentido dos símbolos e a interpretação amplificadora, ou seja, entre as hermenêuticas da suspeita (Freud, Marx e Nietzsche) e as hermenêuticas da recolecção de sentido.
Em O si-mesmo como outro, foi também nos termos de um conflito entre as ilusões de um cogito cartesiano, o qual se autofunda, e as de um cogito nietzschiano, o qual sequer se coloca, que o sujeito crítico acabou alcançando sua trágica condição de cogito ferido.
Assim é que Ricœur reconhece plenamente o momento da racionalidade crítica no centro da operação de interpretação existencial, mas recusa-se a reconhecer na racionalidade uma função fundacional, convidando o marxismo e a psicanálise a se definirem como hermenêuticas. Pelos mesmos motivos, para pensar as objetivações culturais, textuais e históricas do sujeito humano já não bastam os métodos estruturalistas, já que Ricœur vislumbra na função crítica do sujeito um deslocamento da razão em direção à imaginação. Para ele, há que conciliar a função crítica e a função criativa do sujeito humano, por meio de conceitos como “veemência ontológica da metáfora”, “identidade narrativa” e as diversas categorias que dão precedência à existência prática do ser humano.
Desdobrado em narrativas que também são coletivas, o sujeito ricœuriano descoberto pela via da hermenêutica crítica é solidário da reflexividade crítica que sóalcança o conhecimento de si por meio de um longo processo de mediação dos signos culturais. Dessa forma, o processo da necessária crítica das ideologias não é de iniciativa de uma racionalidade sem ideologia, pois não existe para Ricœur razão sem ideologia, mas tem sua origem em outro lugar do imaginário social. Está na utopia, cuja potência crítica essencialmente prática se arraiga em ferramentas da desconstrução racional, ao estilo da escola de Frankfurt, e no entanto, se alicerça em narrativas da liberação e na memória histórica, com seu rol de ações passadas, de tradições culturais, míticas e religiosas.
Buscando tirar todo o proveito da rica concepção ricœuriana de identidade, e mais especialmente interessada nos desdobramentos amadurecidos ao longo da obra do filósofo que possibilitam pensar uma identidade coletiva, a recém criada Associação Rede Brasil-Ricœur convida à comunidade nacional e internacional de pesquisadoras e pesquisadores a questionarem a proposta da hermenêutica crítica de Paul Ricœur.
Levando em consideração o fato de que a sociedade brasileira é marcada pela pluralidade de povos e tradições, mas considerando também o fato de que sua história tem passado por sérias contradições, as quais se acirraram recentemente e levaram-nos a uma crise de identidade nacional, podemos dizer que de várias formas a dinâmica crítica formada pela hermenêutica dos símbolos, dos textos, de si e da ação pode nos interpelar ou até mesmo nos provocar. Como método que se aplica a numerosas regiões do saber, a hermenêutica crítica recomenda não deixar a identidade coletiva se retrair e encolher em forma de mitificação substancialista, pois isso a torna ideológica, e orienta inversamente a passar a identidade coletiva pelo crivo de uma crítica – historiográfica, sociológica, antropológica, teórico-literária, etc. Trata-se, portanto, nesta chamada, de nutri-la com os recursos criativos e utópicos de um pertencimento diversificado como é o nosso.
Paralelamente, se a hermenêutica crítica ricœuriana convida a retificar constantemente a memória pela historiografia, de maneira a limitar o poder ideológico de uma memória meramente afetiva e sem autocrítica, não estaria nisso a chave da distância crítica tão indispensável ao esclarecimento de nossa história, ele mesmo tão necessário à nossa específica convivência?
Por fim, com a crítica das dimensões semiótica e retórica dos textos de nossa cultura, cuja leitura ingênua é preciso limitar, faz-se necessário igualmente explorar os recursos da hermenêutica crítica de Ricœur do ponto de vista da periferia e a partir do pensamento decolonial, a exemplo do trabalho de Ernst Wolff.
Em suma, é possível apostar que, não sendo a hermenêutica crítica uma razão descarnada e abstrata, talvez ela facilite o acesso, pela via longa e difícil da vigilância crítica, às propostas de sentido, de construção e de ação recolhidas entre nós.
Identidade e identidades. Pensar Brasil com Ricœur, pensar Ricœur com Brasil
ANDRÉS BRUZZONE – Presidente da Associação Rede Brasil-Ricœur
Paul Ricœur, um pensamento voltado para o futuro.
CRISTINA HENRIQUE DA COSTA (IEL/UNICAMP)
La arquitectura dialógica de la identidad humana en Paul Ricœur: implicancias éticas y políticas
BEATRIZ CONTRERAS TASSO (Pontifícia Universidad Católica de Chile)
Debatedor: WALTER SALLES (Rede Brasil-Ricoeur)
Hacia una posible re-construcción de la identidad Latinoamericana: Memoria, narración y reconocimiento.
PAULA ANDREA DEJANÓN BONILLA (Universidade Libre – Bogotá)
Debatedor: MANOEL CORACY SABOIA (UFAC)
Sala de Aula CL-01 (IEL/Bloco VI) Eixo: Hermenêutica e Ciências Humanas: História, Sociologia, Literatura, Psicologia e Antropologia, entre outras. | |
14:00 – Thiago Luiz de Sousa | O Ensino de Filosofia: Reflexões a partir do paradigma da tradução |
14:30 – José Sergio Carvalho | Hermenêutica da consciência histórica e forma escola: impactos da ascensão e do declínio dos Tópoi iluministas na educação |
15:00 – Thiago de Castro Leite | Hermenêutica e reconhecimento de si: considerações sobre a experiência de leitura e fruição artística no contexto da formação escolar |
Sala de Aula CL-02 (IEL/Bloco VI) Eixos: Ética, Política e Reconhecimento Hermenêutica e Ciências Humanas | |
14:00 – Letícia Marlene dos Santos Figueiredo; Adelma Pimentel | A analogia do reconhecimento em Paul Ricoeur com a relação pesquisador-colaborador em pesquisas qualitativas |
14:30 – Geison Loschi | A educação como experiência recíproca de reconhecimento: contribuições da antropologia filosófica ricoeuriana para a filosofia da educação |
15:00 – José Aguiar Nobre | Imaginação e ética no pensamento de Paul Ricoeur |
15:30 – Vinícius Oliveira Sanfelice | Imagens na interpretação: Ricoeur e uma hermenêutica da imagem |
Sala de Aula CL-06 (IEL/Bloco VI) Eixos: Ação, linguagem, narrativa e identidade Hermenêutica e Ciências Humanas | |
14:00 – Candice Angélica Borborema de Carvalho | A propósito da relação entre o tempo narrado e a identidade narrativa em Paul Ricoeur |
14:30 – Victor Fermino | O tempo na narrativa de Leopold Bloom: uma leitura de Ulysses pela perspectiva de Paul Ricœur |
15:00 – Leonardo Magalde Ferreira | Dos limites do conceito à imensidão da metáfora: linguagem e realidade em Nietzsche e Ricoeur |
15:30 – Vitor Hugo Reis Costa; Alexandra Dias F. Tedesco | A força silenciosa do enredo: um olhar bourdieusiano sobre o conceito ricoeuriano de identidade narrativa |
Sala de Videoconferências (IEL/Centro Cultural) Eixo: Fenomenologia e Hermenêutica | |
14:00 – José Vanderlei Carneiro | Esboço de uma filosofia da pessoa em Ricoeur |
14:30 – Bruno Fleck da Silva | A vontade criadora e a convicção: a sabedoria prática entre Husserl e Ricoeur |
15:00 – Ellen Karoline da Silva; Maria de Nazareth Malcher | O processo do reconhecimento no trabalho de profissionais de saúde mental |
Filosofia, Teoria literária, literatura: a mediação impossível?
JEAN-LUC AMALRIC (EHESS/Paris)
HÉLIO SALLES GENTIL (USJT)
CRISTINA HENRIQUE DA COSTA (IEL/UNICAMP)
Moderador: ROBERTO ROQUE LAUXEN (UESB)
Quando Ricœur se encontra com Viveiros de Castro.
JEAN-LUC AMALRIC (EHESS/Paris)
Debatedora: CRISTINA HENRIQUE DA COSTA (IEL/UNICAMP)
Conferência (Auditório do IEL / Pavilhão dos Docentes)
Philosophie de la libération versus l’herméneutique? Le « débat » Dussel-Ricoeur et sa signification contemporaine
ERNST WOLFF (KU/Leuven)
Debatedor: FERNANDO NASCIMENTO (BOWDOIN COLLEGE/EUA)
Sala de Aula CL-01 (IEL/Bloco VI) Eixo: Hermenêutica e Ciências Humanas: História, Sociologia, Literatura, Psicologia e Antropologia, entre outras. | |
13:30 – Rita de Cássia Oliveira | A obra “Temps et récit”, de Paul Ricoeur, é atravessada por uma teoria do romance? |
14:00 – Pedro Henrique Cristaldo Silva | Distanciamento hermenêutico e ideologia subjacente na pesquisa em Ciências Humanas |
14:30 – Leonardo Caffaro | Fundamentalidade e Legitimidade. O Direito como experiência (historicidade da positivação) e legítimas expectativas de normatividade (comunicação normativa). Uma abordagem do Direito, da justiça e da democracia a partir da fenomenologia hermenêutica de Paul Ricoeur |
15:00 – Adriano Carvalho Viana | A hermenêutica ricoeuriana e a análise do Tomo I, da À la recherche de Proust |
Sala de Aula CL-04 (IEL/Bloco VI) Eixo: Ética, Política e Reconhecimento | |
13:30 – Elton Quadros | Reconhecimento e plano jurídico |
14:00 – Claudia Aita Tiellet | Reconhecimento da mulher: respeito e solicitude à luz da pequena ética de Paul Ricoeur |
14:30 – Maria de Nazareth Rodrigues Malcher de Silva; Adelma Pimentel | Processo do reconhecimento de Paul Ricoeur e analogias no campo da saúde mental |
Sala de Aula CL-13 (IEL/Bloco VI) Eixo: Ação, linguagem, narrativa e identidade | |
13:30 – Manuel Prada Londoño | Configuración de identidades narrativas en el uso de redes sociales |
14:00 – Adelma Pimentel; Maria de Nazareth Rodrigues Malcher de Silva | Hermenêutica da linguagem e da ação no discurso clínico |
14:30 – Francisco Valdério | Paul Ricoeur e o afrontamento da violência pela narrativa do processo jurídico |
Sala de Videoconferências (IEL/Centro Cultural) Eixos: Memória, história e identidade brasileira Identidade, raça e gênero | |
13:30 – Ligia Zambone Moreira | O sofrimento do exílio: limites e potencialidades da categoria ricoeuriana de sofrimento |
14:00 – Rafael Zanata Albertini | Narrativas fora do armário: a identidade sexual de homens gays na cidade |
14:30 – Erica Munhoz | Para uma hermenêutica crítica da tradição de mulheres em literatura |
Mesa 2 (Miniauditório e/ou Sala de videoconferências do Centro Cultural do IEL)
Paul Ricoeur e decolonialidade em perspectiva brasileira
CRISTINA VIANA (UFAL)
FERNANDO NASCIMENTO (BOWDOIN COLLEGE/EUA)
WEINY CÉSAR FREITAS (UFMS)
Moderadora: LORENA SCHALKEN (UNAMA)
Ferramentas ricoeurianas úteis na perspectiva interdisciplinar: símbolo, conflito de interpretações, hermenêutica crítica, metáfora, identidade narrativa, cogito partido
CRISTINA HENRIQUE DA COSTA (IEL/UNICAMP)
JEAN-LUC AMALRIC (EHESS/Paris)
Le dépaysement comme modalité historiale de la toposéité significative
VINCENT DAVY KACOU (Domuni Universitas/Toulouse)
Debatedor: ANDRES BRUZZONE (Rede Brasil-Ricoeur)
Sala de Aula CL-01 (IEL/Bloco VI) Eixo: Estudos da Religião e Filosofia | |
10:30 – Frederico Soares de Almeida | O homem capaz e a religião a partir da filosofia de Paul Ricoeur |
11:00 – Antonia de Sousa Vieira Soares | Filosofia da religião no pensamento de Ricoeur: uma poética da esperança entre figuração e saber absoluto |
11:30 – Arlindo José Vicente Jr. | “Onde estava Deus naqueles dias? Por que Ele silenciou?”. Discurso, silêncio e a narrativa da Igreja Católica em Auschwitz: a lamentação como prece |
12:00 – Donizete José Xavier | A linguagem religiosa e a poética da existência
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Sala de Aula CL-02 (IEL/Bloco VI) Eixo: Ética, Política e Reconhecimento | |
10:30 – Manoel Coracy Saboia Dias | Primeiros esboços de uma filosofia política ricoeuriana |
11:00 – Paulo Gilberto Gubert | A assimetria e os estados de paz |
11:30 – Ozeli Oliveira dos Santos | Violência no falar político a partir de Paul Ricoeur |
Sala de Aula CL-08 (IEL/Bloco VI) Eixo: Ação, linguagem, narrativa e identidade | |
10:30 – Denizart Busto de Fazio | Habitar mundos estranhos a nós: uma ideia de educação a partir de Ricoeur |
11:00 – Thiago Moreira | A dimensão narrativa da docência no contexto da escola pública |
11:30 – Caroline Fanizzi | O professor readaptado e a desnarrativização da sua experiência |
Sala de Videoconferências (IEL/Centro Cultural) Eixos: Fenomenologia e Hermenêutica Memória, história e identidade brasileira | |
10:30 – Roberto Roque Lauxen | O problema de uma teoria geral do julgamento em Paul Ricoeur |
11:00 – Caetano Diniz; Adelma Pimentel | Uma proposta metodológica para análise do discurso baseada na hermenêutica de Paul Ricoeur |
11:30 – Rodrigo Augusto de Souza | O retorno do acontecimento: Uma análise de Paul Ricoeur sobre a historiografia francesa do Século XX |
12:00 – Anita Pompéia Soares | Entre o horizonte de expectativas e o espaço de experiência: o passado como “tradição viva” na escola brasileira |
Reunião de trabalho (Sala dos Colegiados do IEL – Pavilhão dos Docentes)
Projeto e desenvolvimento da Associação REDE BRASIL-RICOEUR
Coordenação: ANDRES BRUZZONE (Presidente da REDE BRASIL-RICOEUR)
As armadilhas da identidade
Jeanne-Marie Gagnebin (PUC-SP / IFCH-UNICAMP)
Debatedora: Cristina Viana (UFAL)
Pesquisadores nacionais e internacionais são convidados a submeter resumos de suas pesquisas de acordo com as seguintes orientações:
PRAZOS
Período de submissão dos resumos: 28/02/2023 a 31/05/2023
Divulgação dos resumos aprovados: 15/06/2023
*Os resumos dos trabalhos aprovados serão publicados nos anais do evento.
Matiz Barão Geraldo Express Hotel – Três Estrelas, Valor R$ 238,00 (a diária) – 1,8 Km do IEL, 22 minutos caminhando
Vitória Express Dom Pedro – Três Estrelas, Valor R$ 235,00 (a diária) – 6,1 Km, 11 min de Uber